Tudo aquilo que nunca foi dito


Título: Tudo aquilo que nunca foi dito

Autor: Marc Levy
Editora: Suma de Letras 
Páginas: 244
ISBN: 9788581050089

Anthony Walsh sempre fora um pai ausente, Julia lembrava-se das longas viagens do pai, um empresário brilhante. Ela era apenas uma menininha e esperava com grande expectativa a volta do pai. Depois veio a época em que sua mãe adoeceu: os lapsos de memória aumentavam aos poucos e ela confundia os cômodos da casa e esquecia o nome das pessoas com quem convivia. O pior momento para Julia foi quando sua mãe não reconheceu mais a filha. 

Depois da morte da mãe e início da adolescência de Julia, Anthony Walsh viajava cada vez mais e essas viagens costumavam durar mais. Julia passava as noites fazendo lição de casa com a ajuda do secretário particular de seu pai, ia ao colégio, iniciou os estudos superiores, mas os largou para se dedicar a sua maior paixão, a invenção de personagens, com os quais trabalhava até hoje, dando-lhes forma com tintas coloridas e vida na tela do computador. 

Há anos pai e filha não se falam e Julia irá se casar em quatro dias. Seu melhor amigo e confidente, Stanley, tenta convencer a amiga a dar uma chance para o pai, mas Julia é irredutível e quer ser levada até o altar pelo amigo. Mesmo tendo enviado o convite de casamento para Anthony, Julia tem certeza que ele não irá comparecer ao casamento, provavelmente por estar no exterior em mais uma de suas viagens. 

Julia não poderia estar mais enganada, pelo menos em parte. Seu pai realmente estava no exterior e não em Nova York. Ela recebe uma ligação de seu celular e quem fala é o secretário particular de seu pai: Anthony Walsh morreu em Paris, o corpo está sendo repatriado de avião e o enterro será dentro de quatro dias, no sábado, justamente na tarde de casamento de Julia.

"- Como eu vou dizer tudo isso para ele?
- Querida, ele deve entender que é bastante complicado enterrar o pai e, na mesma tarde, se casar. Como eu acho possível que uma ideia dessas possa mesmo assim passar pela sua cabeça, devo lembrar que seria bem inconveniente. Mas como é que uma coisa assim pode ter acontecido? Deus do céu!
- Pode acreditar, Stanley, Deus não tem nada a ver com isso, foi só o meu pai que, por si só, escolheu essa data.
- Eu não acho que ele tenha decidido morrer na noite de ontem, em Paris, com a única finalidade de prejudicar o seu casamento, apesar de reconhecer que houve um certo requinte na escolha do local!
- Você não conhece ele, é capaz de tudo para me chatear!" (p. 15)

No enterro só estavam presentes Julia, seu noivo, Adam, Stanley e o secretário de Anthony. O dia estava perfeito, perfeito para um casamento. Julia não podia estar com mais raiva do seu pai.

Ela diz ao noivo que quer ficar sozinha para poder processar tudo e Adam vai passar alguns dias na casa de campo de seus pais. No trabalho, Julia recebe uma ligação um tanto irritada de seu vizinho: um enorme caixote com o nome de Julia boqueia a loja do Senhor Zimoure e o jeito é contar sobre a chave reserva que esconde debaixo do tapete da escada para que o caixote seja levado para seu apartamento. 

Julia chega em seu apartamento sem saber de onde poderia ter vindo aquela encomenda, afinal ela não tinha feito nenhuma. O caixote de madeira era enorme e logo abaixo do Frágil estava estampado o seu nome. Com algum esforço Julia conseguiu abrir aquela enorme caixa e se deparou com uma espécie de estátua de cera com o tamanho de uma pessoa, tratava-se de uma réplica perfeita de Anthony Walsh, seu pai, logo à sua frente. A semelhança era impressionante, a réplica parecia até mesmo estar viva. 

Ao observar melhor aquela escultura, fruto provavelmente de uma brincadeira de muito mau gosto, Julia reparou um pequeno papel preso com alfinete na dobra da manga do paletó, onde uma flecha desenhada apontava para o bolso de cima do paletó. As palavras rabiscadas no verso eram "Ligue-me". Aquela era definitivamente a caligrafia de Anthony. 

Do bolso saía algo como um controle remoto onde havia um único botão branco. 

"O dedo apertou o botão, ouviu-se um pequeno estalo e as pálpebras daquilo que deixava de ser uma estátua se ergueram; o rosto esboçou um sorriso e a voz do seu pai perguntou:
- Já sente um pouco a minha falta?" (p. 37)

Aquilo era impossível, mas lá estava o seu pai, bem na sua frente, tagarelando e gesticulando. Anthony explica que há alguns anos virara acionista de uma empresa de alta tecnologia que desenvolve robôs, mais precisamente, humanoides.

"- Você voltou ao mundo para vir passar o aspirador em casa?
- ... Fazer compras, tomar conta da casa, atender ao telefone, dar resposta a todo tipo de pergunta, são de fato, aplicações possíveis. Mas digamos que a sociedade de que eu falo desenvolveu um projeto mais elaborado e de certa forma mais ambicioso.
- Como?
- Como o de dar a possibilidade de alguns dias suplementares de presença." (p. 40 e 41)

Aquilo era a maior piada do mundo para Julia. Ela e seu pai não tinham notícias um do outro há um ano e cinco meses e agora ela enfrentava o luto, apesar de não se sentir triste com a morte do pai, no entanto, Anthony Walsh estava na sua sala, dizendo que ela havia recebido um presente. A possibilidade de ouvir o seu pai e dizer coisas que nunca havia lhe dito. 

Claro que aquilo, aquela máquina, não era o seu pai, mas possuía sua memória e sua aparência. Além disso, os dois possuíam seis dias, nada mais, as baterias durariam apenas esse tempo. Julia também podia apertar o botão e desligar o seu "pai", a empresa viria buscá-lo. 

Enquanto processava tudo aquilo e apesar da mágoa e ressentimento que sempre nutriu pelo pai, Julia resolveu não apertar o botão e desligá-lo. No lugar disso, os dois fariam uma viagem para Montreal, local onde ela passaria sua lua-de-mel, afinal, segundo Anthony, por que perder aquelas passagens já pagas? Bastaria trocar o nome de um dos passageiros. 

"- Uma pequena viagem. Sem telefonemas do escritório, sem aparições de surpresa do seu noivo, sem noitadas nos olhando como dois enfeites de móvel na frente da televisão, e sim passeios, em que falemos os dois. Foi por isso que eu vim de tão longe. Por um momento, alguns dias, nós dois, só nós dois!" (p. 58)

Tudo aquilo que nunca foi dito, de Marc Levy, é lindo, lindo, lindo! O livro já estava na estante há algum tempo e fico feliz por não ter esperado mais para ler. Foi o primeiro livro do autor que li e foi uma tremenda surpresa. Ri e me emocionei, encantei-me com os personagens, super bem desenvolvidos e com a história bem elaborada, além da escrita cheia de sensibilidade. Tudo aquilo que nunca foi dito é um romance que traz temas como amor, família, amizade etc., com uma pitada de fantasia e ótimos diálogos: engraçados, sarcásticos e inteligentes, além de cheios de emoção. 

Julia e Anthony são incríveis juntos, dois teimosos e que realmente têm muito o que dizer um ao outro. Stanley é divertido e tem ótimas tiradas, além de ser um conselheiro maravilhoso para Julia. São personagens que dificilmente o leitor não conseguirá se apaixonar e sentir saudades depois da leitura. 

Outro ponto que gostei muito do livro foi como o autor tratou de um tema da História, não de forma didática, mas cheia de emoção, com personagens vivendo um momento muito importante e que é retratado de forma muito especial no livro. 

Com certeza, uma ótima leitura!

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