Título: Fale!
Autor: Laurie Halse Anderson
Editora: Valentina
Páginas: 248
ISBN: 9788565859073
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"Os alunos mais velhos podem ficar perambulando até o sinal tocar, mas os do primeiro ano são conduzidos como rebanho até o auditório. A gente se divide em tribos: Atletas, Clubbers, Pseudointelectuais, Cheerleaders, Lixo Humano, Euro-ralé, Futuros Fascistas Americanos, Minas Cabeludas, as Marthas, Artistas em Crise, Jovens Atores, Góticos, Esportistas Radicais. Eu não pertenço a nenhuma. Desperdicei as últimas semanas de férias vendo desenhos idiotas. Não fui para o shopping, nem para o lago, nem para a piscina, nem atendi ao telefone. Entrei no ensino médio com o corte de cabelo errado, as roupas erradas, a atitude errada. E não tenho ninguém com quem possa me sentar." (p. 16)
Melinda é uma excluída e sabe disso já no seu primeiro dia de aula no colégio Merryweather. Não procura ir atrás de suas ex-amigas, não faria a menor diferença. A tribo delas, as Basiconas, acabou se fragmentando e cada caco restante acabou sendo recolhido por uma "facção" rival. Nicole acabou por passar seu tempo ao lado dos Atletas e Ivy oscila entre os Artistas em Crise e os Jovens Atores. Jessica se mudou para Nevada e Rachel, ex-melhor amiga de Melinda, tem andado com os alunos de intercâmbio, em uma tentativa de resgatar sua herança europeia.
Se existe alguém com quem Melinda gostaria de falar sobre o que aconteceu, essa pessoa seria Rachel. E mesmo com sua garganta pegando fogo sabe que não adianta, Rachel a odeia. Todos a odeiam. Afinal, Melinda foi a garota que ligou para a polícia e destruiu a tradicional festinha que os veteranos promovem para comemorar a chegada das férias e, para piorar, mandou vários "colegas" para a prisão.
Melhor não pensar mais nisso, imagina Melinda. Foi péssimo, mas já acabou.
"São 8:50 da manhã. Só faltam 7 tempos de aula e 699 dias para a formatura." (p. 19)
O ensino médio é uma grande mentira, deveriam ser mais claros:
1) Não, ninguém está aqui para ajudá-los;
2) Os orientadores educacionais não dão a mínima para vocês e não estão dispostos a escutá-los;
3) Você não irá sentir saudade do tempo passado conosco.
As duas primeiras semanas de colégio terminam sem Melinda ter uma crise de nervos. Ela tem uma técnica: é muito mais fácil não dizer nada, fechar a matraca. Tudo aquilo que se ouve na TV sobre se comunicar e se expressar o que sente não passa de babaquice, o negócio é calar o bico.
Melinda consegue sentar com uma nova garota que acabou de se mudar de Ohio no refeitório, um dos lugares mais críticos do colégio. Heather é bem tagarela, o que ajuda na "relação" das duas. Melinda apenas precisa acenar com a cabeça ou soltar um "a-hã" quando Heather passa horas ao telefone. Rachel e seus amigos, pelo menos aquelas pessoas que Melinda conhecia há nove anos, continuavam a ignorá-la, apesar de esbarrarem nela constantemente e seus livros serem arrancados de seus braços e jogados no chão com frequência.
A aula de artes é logo depois do almoço, o momento crítico do dia, e muito bem-vinda. O professor Freeman é feio, com um corpo de gafanhoto velho e um nariz como um cartão de crédito enfiado nos olhos, mas é o único professor que sorri quando todos os alunos entram em fila na sala.
"Ele está encurvado sobre um pote girando, as mãos avermelhadas, por causa da argila. - Bem-vindos à única aula que vai ensiná-los a sobreviver - diz o professor. Bem-vindos à Arte." (p. 23)
O professor Freeman tem um projeto para o ano letivo. Todos os alunos pegam um pedaço de papel dentro de um globo e nele existe o nome de um objeto, uma palavra. Os alunos deverão passar o resto do ano aprendendo a transformá-lo em uma obra de arte e para isso farão esculturas, moldes de papel machê, entalhes, desenhos, tudo com base no objeto ou na palavra. Existe uma condição: os alunos deverão encontrar uma forma de fazer com que o objeto diga algo, transmita uma emoção.
"O prof. Freeman desliga a roda e pega um pedaço de giz sem nem lavar as mãos. "ALMA", escreve no quadro. Filetes de argila riscam a palavra, parecendo sangue seco. - É aqui que vocês encontrarão suas almas, se ousarem. Que poderão achar aquele lado de vocês que jamais se atreveram a ver antes. Não me venham pedir que lhes mostre como desenhar um rosto. Venham pedir, isso sim, que eu os ajude a encontrar o vento." (p. 24)
Melinda pega a palavra árvore. Fácil, ela sabe desenhar uma desde a segunda série. Essa tarefa parece ser divertida. Mas enquanto se empenha cada vez mais no projeto se vê perdida. Definitivamente as aulas de arte são o seu refúgio, mas até que ponto Melinda consegue se expor?
Enquanto isso, ela falta as aulas e suas notas caem cada vez mais. Melinda definha e torna-se cada vez mais frágil. A relação com seus pais também não é nada boa: Melinda sempre está sozinha, a comunicação se dá através de bilhetes no balcão da cozinha.
""Por que você não diz nada?""Pelo amor de Deus, abra a boca!""Quanta imaturidade, Melinda.""Diga algo.""Ao se recusar a colaborar, a maior prejudicada é você mesma.""Eu não sei por que ela está fazendo isso conosco."" (p. 135)
O diretor, a orientadora, seus pais. Com o que eles realmente estão preocupados? Estão dispostos a ouvir Melinda?
"Eu sei que os parafusos da minha cabeça estão meio soltos. Quero ir embora, pedir transferência, me mandar daqui em velocidade de dobra espacial para outra galáxia. Estou a fim de confessar tudo, de passar a culpa, o erro e a raiva para outra pessoa. Tem um monstro nas minhas entranhas, posso até ouvi-lo arranhando minhas costelas. Mesmo quando descarto a lembrança, ela continua comigo, me ferindo. O meu cubículo é um cantinho legal, um lugar tranquilo, que me ajuda a manter esses pensamentos dentro da minha mente, onde ninguém pode ouvi-los." (p. 67)
Fale!, de Laurie Halse Anderson, é um livro que causa impacto e é de um extremo realismo. Assim como Garotas de Vidro (resenha aqui), da mesma autora, é um livro sobre jovens e com uma linguagem para jovens. Laurie sabe fazer isso muito bem, envolver o leitor adolescente em uma narrativa moderna (a autora não parou no tempo) e que transmite todo o sofrimento, desespero e, por que não, terror da personagem?
Melinda é uma personagem retraída, machucada, fragilizada, traumatizada e calada. Seus diálogos são internos e mesmo assim a personagem se torna cativante desde o início da leitura. Sua visão sobre o colégio, os estereótipos etc., são divertidas e ao mesmo tempo tristes, bastante realistas mas com uma dose de pessimismo que acompanha a personagem.
Os diálogos entre os outros personagens, os professores, o dia a dia no colégio, a relação de Melinda com seus pais, que mesmo quando presentes são ausentes emocionalmente etc., são tratados de forma formidável. Laurie convida o leitor a todo momento para a reflexão e o debate e mergulhamos de cabeça neste romance tão honesto e crítico.
Fale! se transformou em obra paradidática em diversas escolas de ensino fundamental, médio e até mesmo universidades. Além disso, nos últimos dez anos a autora recebeu milhares de cartas e e-mails de pessoas confidenciando suas histórias. No início do livro existe um poema feito com frases e palavras extraídas dessas cartas e e-mails, é algo lindo e forte de se ler.
"Eu gostaria de pensar que, em uma pequena escala, Fale! os está ajudando a encontrar suas vozes. Mas esta obra é só um instrumento. Os verdadeiros heróis e heroínas são os que olharam para dentro de si - para além do medo, da vergonha, da depressão e da raiva - e criaram CORAGEM para contar as suas histórias. Tenho o mais profundo respeito por elas." (Laurie Halse Anderson)
Assisti ao filme logo depois de terminar de ler o livro (aqui o filme leva o título O Silêncio de Melinda). Não posso dizer que não gostei do filme, mas ele também não me agradou tanto assim. Kristen Stewart não conseguiu convencer no papel de Melinda, seu personagem não passou a dor e a angústia da Melinda do livro. Uma adaptação também não precisa ser 100% fiel ao livro, mas na minha opinião precisa manter sua essência e isso não aconteceu.
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O legal de ler resenhas é esse, saber como o livro é. Se você vai gostar ou não, e esse eu tenho certeza que vou amar. Beijos e parabéns pela resenha!
ResponderExcluirParece que a autora tem seu foco nos dramas reais da vida dos adolescentes, eu vejo como um fator super importante discutir esses problemas pelos quais os adolescentes passam, externar a angústia e a frustração de se sentir só e incompreendido. Deve ser uma leitura impactante, tanto quanto Garotas de vidro.
ResponderExcluireu nem sabia q tinha filme esse livro
ResponderExcluirainda nao li o mesmo mas assim q der vou ler e quem sabe eu assista tbm xp
Este parece ser um livro extraordinário. Todas as resenhas que li foram positivas e a sinopse e todo o contexto me agradaram bastante.
ResponderExcluirNão sabia que existia um filme sobre o livro e ainda mais com a Kristen, que não curto muito a atuação dela.
Oi, Paula! Você já viu o filme? Ah,é ótimo. Estou louca para comprar esse livro mas já estou com tantos pra ler :c
ResponderExcluirQuem sabe eu não peça de natal, rs
beijão