O Eterno Barnes


Título: O Eterno Barnes

Autor: Salustiano Luiz de Souza
Editora: Novo Século/Novos Talentos da Literatura Brasileira
Páginas: 248
ISBN: 9788576798750


O Doutor J. Barnes era solitário, vivia uma vida simples e possuía hábitos simples. Ultimamente pouco saía com sua namorada, a Doutora Lourdes, e vivia quase como um ermitão.

Bruno, seu colega de anos e diretor do hospital em que trabalhava, perguntava por que Barnes não voltava a lecionar, mas o médico dizia estar muito ocupado com as suas pesquisas. Mesmo com a insistência de Bruno para a publicação dessas pesquisas, Barnes dizia que não queria mais publicidade, tampouco fama ou dinheiro. Ele busca algo muito maior. 

"A vida, busco apenas a vida, pensava. Não lembrava mais quando começara a maturar aquela ideia, que afinal se tornou obsessão e lhe consumia a maior parte do seu tempo, da sua vida. Interessante como a ideia da vida está intimamente ligada à morte, e tudo depende deste entrelaçamento vida-morte-vida. Para viver precisamos matar a todo instante, seja a carne que matamos para saciar a nossa fome, seja a planta que matamos pelo mesmo motivo, pois sempre nos alimentamos da morte, e até mesmo o medicamento que tomamos mata o microrganismo que vive na nossa vida. Triste missão que nos foi confinada, a de tirar a vida dos demais para nos mantermos vivos. Somos os urubus da vida e nos refestelamos com a carniça da morte". (p. 27)

O projeto de Barnes estava bem claro em sua mente: ele buscava a eternidade e cada vez mais encontrava os meios de conseguir encontrá-la. Ele era como um alquimista e estava em busca de sua pedra filosofal. 

Já haviam criado um software que tentava imitar um cérebro, algo como uma nova geração de processadores experimentais projetados para emular as capacidades do cérebro: percepção, sensação, ação, interação e cognição.  Mas não era isso que Barnes queria. O neurocirurgião queria ir muito além, fazer algo realmente inusitado. A ideia de Barnes era copiar um cérebro, ou seja, transformar os impulsos elétricos ocorridos dentro de uma cabeça em um arquivo de dados e depois implantar esse arquivo de dados em outra cabeça. E isso deveria ocorrer de forma completa, abrangendo toda a vida anterior e atual da pessoa. As emoções, as experiências, os conhecimentos etc., tudo seria transplantado, criando, assim, um novo ser a partir de outro, como a mescla de duas almas. 

Mas Barnes precisava de ajuda e encontrara James, um engenheiro,  o melhor aluno de mecatrônica e parte da equipe de jovens professores da Universidade. Apenas ele tinha paciência o bastante para estudar as antigas linguagens de programação e agora estudava os arquivos que Barnes lhe confiara, dizendo se tratar de uma pesquisa de um amigo. No entanto, aqueles arquivos possuíam um padrão totalmente diferente, sem ordem... um sistema realmente complexo. 

"Sim, Barnes estava tendo justamente esta sensação, parecia que aquilo lhe magnetizava, parecia que aquilo formava um corpo e esse corpo pedia a Barnes para cuidar dele. Que estranha sensação. E a música que provinha dali? Era como se fosse uma sinfonia cerebral, uma música que tocava não para os ouvidos, mas uma música que soava dentro do coração, que estremecia o corpo e arrepiava a pele. Algo realmente muito estranho". (p. 44)

Aqueles arquivos que Barnes entregara a James e que o engenheiro conseguira abrir eram, na verdade, a vida de alguém. Todas as emoções, conhecimentos e experiências de alguém estavam condensados ali, em pouco mais de mil arquivos com 800 megabytes de memória. 

"A vida, a vida encapsulada num pen drive. Será que é isso que somos?" (p. 46)

Barnes pedira segredo, mas James estava maravilhado com o que via. No computador ele via a comprovação de que realmente existia um sistema virtual holístico, vivo e mutante. Trabalhar com aquilo era um desafio, mas ele estava muito excitado, havia muito o que pesquisar, desvendar. E James pensava no quanto aquilo que estava bem a sua frente poderia trazer inúmeros benefícios para a humanidade. No entanto, precisava adentrar na alma daqueles arquivos e logo teria de devolver todo o material ao Doutor Barnes. O engenheiro procurou de diversas maneiras copiar aqueles arquivos, mas não havia como. Barnes tinha sido esperto, impossibilitando a cópia dos arquivos. Bom, não tão esperto assim, pois James conseguira copiar os arquivos em uma brecha que o Doutor Barnes havia deixado passar. 

James não entendeu quando o neurocirurgião pediu o notebook com os arquivos, já que a pesquisa estava apenas iniciando, mas havia sido pago pelo serviço todo e conseguira salvar os arquivos. Mas agora James tinha medo, muito medo do Doutor Barnes. 

Doutor Barnes precisava de mais algumas coisas para poder realizar a sua experiência. Quem seria ele no futuro? Ele já resolvera isso, escolhendo um paciente chamado Alexandre Granenko: alto, atlético, sem familiares próximos e em coma. Era perfeito. O que o incomodava mesmo nesse momento era a forma como poderia ser ele mesmo a sua própria cobaia. Isso não era incomum no meio dos pesquisadores, mas seu experimento tratava-se de algo diferente, algo bem profundo. Doutor Barnes iria implantar sua vida dentro de outra pessoa, de outra vida. E para isso o criador deveria morrer, dando vida a criatura. 

"Por que temos essa vontade louca de nos perpetuarmos no tempo? Ou seria no espaço? Einstein diz que são uma única coisa. Essa ânsia de viver e viver e viver. De sermos eternos. De certa forma, já somos eternos, pois nossos genes são repassados para nossos filhos, que os repassam para nossos netos, na infindável cadeia da vida. Mas não participamos conscientes deste processo, não somos convidados para essa eternidade, apenas nossos genes. A vida passa ao largo da gente, faz pouco caso, nos transforma em meros espectadores. É isso que somos: espectadoras da vida. Apenas objetos repassadores de genes, com instintos selvagens de nos perpetuarmos a qualquer custo". (p. 58)

"Meu sorriso, minha voz, meus pensamentos, meu eu, tudo em mim é único. E esta singularidade a morte ceifa e se acaba para todo o sempre". (p. 61)

Mas isso acabaria agora. Barnes já não se importava com quantos comas induzidos foram necessários para comprovar experimentos, também não se importava com quantos cérebros havia utilizado para inocular estranhas substâncias. Justificava-se no argumento da luta pela sobrevivência, afinal, todos fazemos isso para nos mantermos vivos e as malditas células cancerosas em seu estômago não faziam o mesmo? O "tudo pela ciência" havia se transformado em "tudo pelo Barnes". 

Mas, além de um corpo, Barnes precisaria da ajuda de um outro médico, alguém de extrema confiança para realizar os procedimentos necessários que ele não conseguiria realizar sozinho. Sabia muito bem que Lourdes era muito ética e zelosa pela profissão. Mas Barnes não iria esperar mais e também não revelaria tudo para Lourdes, pois aquele era seu projeto, além de seu futuro e seu futuro iria depender das mãos habilidosas da Doutora Lourdes.

"Quando Barnes contou a ela sobre suas experiências e o que pretendia, Lourdes ficara, no início, aterrorizada com a ideia, seria ele um Frankenstein da vida? Depois começara a ficar estranhamente meditativa, porque a ideia não saía mais de sua cabeça. Será que era justo apropriar-se do cérebro de alguém, inocular-se sorrateiramente como um vírus, como um hospedeiro?" (p. 86 e 87)

Apesar da relutância, Lourdes acaba aceitando realizar os procedimentos em Barnes, devido a sua chantagem emocional, afinal, a médica ainda ama Barnes, pelo menos o homem pelo qual se apaixonou. 

Enquanto isso, James mantinha os arquivos consigo, e tinha um plano para forçar Barnes a revelar os seus segredos, pois a humanidade precisava saber daquilo e quem sabe James pudesse partilhar dessa glória. Mas por temer Barnes, resolveu dar uma cópia dos arquivos para a sua namorada, Tatiana.

James apenas não sabia que Tatiana tinha um caso com Bruno, o diretor do hospital, um homem muito ambicioso e nada ético. Tatiana iria entregar os arquivos para Bruno se ele elevasse seu cargo na Universidade, afinal o relacionamento dos dois era assim, buscavam sempre sair ganhando, e sempre se respeitavam como oponentes. Bruno finalmente entendera o comportamento estranho e isolado de Barnes e logo imaginou a repercussão de tudo aquilo, os prêmios e os convites para outros projetos, além das verbas que a Universidade viria a receber e quem sabe, Bruno poderia se tornar o futuro reitor da Universidade. 

Mas antes de tomar total conhecimento do projeto, Barnes e Lourdes são encontrados mortos ao lado de um paciente em coma, Alexandre, por uma enfermeira. 

Logo a polícia está dentro do hospital e da Universidade, investigando o ocorrido. Mas teria Barnes alcançado seu intento? 

O Eterno Barnes, de Salustiano Luiz de Souza, é um livro com uma história incrível! Aborda diversos assuntos, como filosofia, ética, poder etc., além de compreender uma gama de personagens de personalidades variadas que vão se descortinando durante a leitura, fazendo com que o leitor descubra quais as suas intenções e seus desejos, como também o funcionamento das relações diante de determinadas situações que levam os personagens a atitudes drásticas, mesquinhas e tétricas. 

A vida é questionada, assim como o que somos, de onde viemos, para onde vamos e o que fazemos neste intervalo. 

A leitura é recheada de mistério e debates, levando o leitor a se fazer diversas perguntas. A narrativa em terceira pessoa é impecável e muito limpa. Coesa e, apesar de se tratar de uma história que envolve termos médicos, eles são utilizados de forma que o leitor que não está acostumado com estes termos não fique perdido e tenha uma leitura tranquila. 

O final é surpreendente e de arrepiar, definitivamente, uma leitura que aconselho.

10 comentários:

  1. Sendo sincera, fiquei um pouco confusa no começo com a historia toda, como assim um medico quer transplantar um celebro com todas as memorias e tudo mais? Isso não entra muito na minha cabeça, acho que só lendo o livro, né?

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  2. Adoro livros com misterios, debates, filosofia e etc. Gosto de livros que deixam alguma reflexão, são melhores de ler.
    Adorei a resenha!

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  3. Caramba!!!
    Sabe que é um tema bem atual? Dá até medo que alguém o coloque em prática. hahaha
    Será que Barnes conseguiu? Ai meus sais, fiquei elétrica lendo só a resenha.
    Tenho de dizer que eu não esperava que fosse assim tão envolvente, mas os trechos que vc selecionou me fizeram ver que a leitura vale mesmo a pena. =)

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  4. Apesar da resenha positiva, não me interessei muito pelo livro.
    Não me chamou muito a atenção, parece ser otimo, mas não teve nenhum atrativo em especial para mim.

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  5. Eu não estou acostumada com termos médicos mesmo, e isso é um lado positivo do livro de facilitar para nós.
    Espero poder me arrepiar com o livro também :D

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  6. Gosto de livros pé no chão, gosto daqueles que depois de fechado deixam uma coisa boa na nossa vida.
    Quero muito ler o livro e poder conhecer mais sobre a vida.

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  7. Ai confuso toda essa história dele em volta do cérebro... me perdi j na história de criar um software para imitar um cérebro...
    Não me animei com esta história do livro não.

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  8. Li várias resenhas bem positivas, a premissa é bem diferente, mas não despertou minha curiosidade...

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  9. O livro parece ser ótimo, adorei a resenha e fiquei interessada no livro. Espero ter a oportunidade de lê-lo.

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  10. Genteeee... eu jurava q pela capa era um livro d auto ajuda.. hahaha
    mas li a resenha e vi q na verdade nem é né..
    Parece ser um livro muito interessante!!!
    misterios e tals!!

    bjs

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