Alyssa Gardner é tataraneta de Alice Liddell, a garota que inspirou o romance Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll. Até aí, tudo bem. Se bem que desde que todos na escola descobriram seu parentesco com Alice as coisas ficaram bem chatas, quer dizer, não é nada bacana ouvir piadinhas sobre o rabo branco de coelho que Alyssa esconde ou que a garota é uma espécie de amante escrava do Chapeleiro Maluco. Mas até aí, nada fora do normal, afinal crianças e adolescentes podem ser realmente bem maldosos, e Alyssa tem Jeb, seu grande amigo há vários anos, mas, espera, as coisas na vida de Alyssa nunca são fáceis e Jeb namora agora Tae, uma garota realmente insuportável, o que distanciou os dois amigos.
Mas nada disso se compara ao que Alyssa passou quando criança ou o que aconteceu com a sua mãe, Alison. Ninguém, nem mesmo Jeb, sabe o que realmente aconteceu, e apesar do pai de Alyssa não gostar de mentiras, ele se permitiu enfeitar a realidade, pois ela era extremamente bizarra. Então, todos imaginam que Alyssa sofreu um acidente de carro quando era pequena com a sua mãe, o que justifica as cicatrizes nas mãos da garota e o fato dela sempre usar luvas e também o porque de sua mãe estar internada em uma clínica, tendo lesionado o cérebro no acidente.
Mas a verdade assusta Alyssa, que sempre visita a mãe com o seu pai, o qual nutre um grande amor pela esposa. Alison também a assusta, afinal ela é a pessoa em quem Alyssa tem medo de se tornar. Aliás, o histórico das mulheres de sua família não é lá animador. Alícia, mãe de Alison, começou a pintar todos os personagens do País das Maravilhas pelas paredes de sua casa quando era adolescente, insistia que eles eram reais e conversava com eles em seus sonhos. Mais tarde, Alícia se lançou em um voo do alto do segundo andar de seu quarto de hospital onde acabara de dar à luz a mãe de Alyssa, a fim de "testar" suas asas, o que a levou aterrissar em um canteiro de rosas e quebrar o pescoço.
Tristeza e depressão pós-parto levaram ao suicídio? O pai de Alyssa acha que Alison sofreu com uma infância instável, o que contribuiu para sua doença, mas Alyssa sabe, não importa o que é, é hereditário. Alyssa guarda esse segredo até mesmo da sua mãe: ela consegue ouvir os sussurros das flores e dos insetos, como um farfalhar de asas na cabeça, por isso seu iPod e fones de ouvidos são tão importantes enquanto ela se concentra na pista de skate. Para silenciar as vozes, Alyssa também adquiriu o hábito de colecionar insetos: bastava espetar um alfinete na barriga de um deles para silenciá-lo rapidamente e com suas vítimas criar mórbidos mosaicos.
Mas não são só as vozes que a incomodam, existe uma presença que Alyssa sente dentro de si, algo que vibra e a obscurece, incitando-a a ir além de seus limites.
Depois de tanto tempo negando tudo o que ouvia e sentia, Alyssa se vê diante de uma descoberta: ela, sua mãe e todas as outras mulheres da família nunca foram loucas.
"Se as vozes são reais, não faz sentido que Alison insista em se vestir como Alice. Por que ela estala a língua? Por que ela tem ataques de fúria sem razão aparente? São essas coisas que a fazem parecer mais louca que tudo. São tantas as perguntas que quero fazer. Eu as coloco de lado, porque existe uma que é a mais premente de todas. - Porque nossa família? - pergunto. - Por que isso acontece conosco?" (p. 43)
Tantos anos sendo sedada e drogada na clínica acabaram piorando o quadro de Alison e o que seu marido mais quer é ter a esposa de volta, então uma segunda opção é oferecida: Terapia Eletroconvulsiva.
Agora Alyssa precisa correr contra o tempo para salvar a sua mãe e a si mesma, deixando de lado a razão e indo em direção a toca do coelho, a fim de quebrar a maldição da loucura da família consertando alguns erros cometidos por Alice no País das Maravilhas. Para isso, será necessário seguir as pistas deixadas por todos os lados, mas muito bem colocadas, resolver charadas e (re)descobrir aspectos da sua natureza, enquanto é guiada pelo egoísta, suspeito e sublime Morfeu, o caos encarnado, e Jeb, aquele cara forte, estável e genuíno, um verdadeiro cavaleiro em armadura reluzente.
Bem que eu pensei comigo mesma que não iria escrever uma resenha tão grande, mas me apaixonei tanto por esse livro que ficou bem difícil, na verdade impossível, resumir tudo e deixar de lado o que eu realmente queria colocar aqui, só para vocês terem uma amostra desse livro maravilhoso que me encantou. Extremamente visual, O Lado Mais Sombrio parece um filme que se passa numa tela gigante com cenários que saltam dela e cercam o leitor enquanto passamos por cada capítulo. É como estar envolvido ao máximo em um emaranhado de cores, sons, cheiros, texturas e sabores, uma explosão que confere a todos os sentidos uma experiência única e vívida.
A. G. Howard criou uma história extremamente caprichada, bem elaborada e com personagens pra lá de interessantes e muitas vezes bizarros, sinistros mesmo. O enredo prende o leitor e é de tirar o fôlego.
A atmosfera lúdica e sombria não faz parte apenas do País das Maravilhas, mas também está presente no mundo pré-toca do coelho, ou seja, no mundo "real". E essa dualidade está presente em outros aspectos da história e, é claro, eu tenho que escrever isso, no controverso e delicioso Morfeu.
Ah, a capa é linda e a diagramação é um capricho!
O Lado Mais Sombrio é o primeiro volume da Trilogia Splintered. Vale lembrar que não se trata de uma releitura da obra de Lewis Carroll, mas um tributo ao autor.
O segundo volume, Unhinged, será lançado no dia primeiro de julho desse ano nos Estados Unidos. O último volume, Ensnared, será lançado por lá em janeiro de 2015.
The Moth in the Mirror é um
ebook de 40 páginas que está disponível na
Amazon e outros sites e se trata de um intervalo entre o primeiro e segundo volumes da Trilogia. É narrado tanto por Jeb quanto por Morfeu.