Garota, Interrompida


Título: Garota, Interrompida

Autor: Susanna Kaysen
Editora: selo Única
Páginas: 190
ISBN: 9788573128628
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O ano é 1967 e o mundo sofre grandes transformações. A revolta estudantil inicia-se nos Estados Unidos e segue para os países ocidentais, comunistas, chegando até o Oriente Médio e a América Latina. A revolta desses jovens era caracterizada por contestar aquilo tudo que estava estabelecido social e politicamente. Existe a necessidade de quebrar o que está estabelecido, um sentimento de não-adaptação e a busca de novas formas de ação diferentes das tradicionais contestações. 

"O mundo não havia parado só porque não estávamos nele; longe disso. Noite após noite, corpos diminutos tombavam ao chão em nossa tela de TV; negros, jovens, vietnamitas, pobres. Algumas pessoas mortas; outras apenas temporariamente arrebentadas. Sempre havia mais gente para substituir os que caíam e para somar-se a eles na noite seguinte." (p. 105)

Apesar de acreditar que o motivo para o suicídio é de suma importância, ou seja, deve ser forte, ou tudo dá errado, Susanna tem consciência que seus motivos eram fracos: um trabalho de História Americana que não queria fazer e a pergunta que ela se propusera meses antes: "Por que não me matar?". Oras, morta ela não precisaria fazer o trabalho. Mas ponderar sobre essas questões a desgastava. Como fazer uma pergunta dessas para si mesmo uma vez e depois livrar-se dela?

Talvez, pensava Susanna, muita gente se matasse para colocar fim ao dilema de se matar ou não. 

E tudo o que ela fazia ou pensava era imediatamente incorporado ao dilema. Se fez um comentário idiota, se perdeu o ônibus. Por que não se matar? Mesmo o que era bom entrava nesse jogo. Havia assistido um filme bacana? Talvez não devesse se matar. 

Mas o que Susanna realmente queria era matar uma parte de si, aquela parte que queria se matar, que a arrastava para o maldito dilema do suicídio e transformava cada objeto, cenário ou utensílio de cozinha no ensaio de uma tragédia. Mas ela só descobriu isso depois que tomou cinquenta aspirinas. 

Quando fez isso ligou para seu namorado dizendo que iria se matar, tomou as cinquenta aspirinas e então percebeu seu erro. Saiu para comprar leite e seu namorado foi até a sua casa e contou tudo para a sua mãe. 

Enquanto caminha Susanna sente-se humilhada e arrependida, pranteava sua morte e chegou a sentir compaixão por si mesma e por toda a infelicidade que continha dentro de si. Passando mal, desmaiou. Encontrada, foi levada ao hospital e lá fizeram uma lavagem estomacal nela, uma experiência horrível. 

"No entanto, quando terminaram, perguntei-me se haveria uma próxima vez. Eu me sentia bem. Não estava morta, mas alguma coisa havia morrido. Talvez eu tivesse alcançado meu estranho objetivo de suicídio parcial. Senti uma leveza e uma animação que havia anos não sentia." (p. 47)

Susanna nunca tinha visto o médico que levou vinte minutos para decidir interná-la. A internação foi voluntária, já que Susanna era maior de idade (tinha dezoito anos na época) se não fosse assim, seria por meio de um mandado judicial. O que Susanna não sabia na época era que em seu caso nunca teriam conseguido um mandado judicial. Ela sabia que não era uma ameaça para a sociedade. Talvez para si mesma? Mas aquelas cinquenta aspirinas haviam sido metafóricas, ela queria expurgar um aspecto da sua personalidade. Mas como o médico poderia entender isso? 

Para ele, um homem que vive em um bairro elegante e possui bases que fomentam sua vida, vê o mundo como um todo "ameaçador" e ao se deparar com uma jovem que veste uma saia minúscula e fala em monossílabos, conclui que ela está chapada. Se o mundo é ruim e os padrões da sociedade decaem, essa jovem poderia ser arrastada pela maré abaixo dos padrões "corretos" da sociedade se a devolvesse para esse mundo no estado em que ela se encontra. O que ele estaria fazendo? Algo como "medicina preventiva". 

Sabendo que não era louca, Susanna não acreditava que poderiam trancafiá-la em um hospício. Mas foi no Hospital McLean que ela passou os dois anos seguintes de sua vida. 

Lá ela conheceu várias garotas, entre elas:

Lisa, que sempre costumava fugir, o que deixava as outras garotas tristes, pois Lisa sempre as animava. Ela raramente comia ou dormia e seus pais nunca a visitavam pois Lisa era uma sociopata (pelo menos era o que ela dizia). Lisa aprontava com os outros pacientes e com as enfermeiras, mas também podia ser agradável quando queria. 

Polly havia ateado fogo em si mesma com gasolina quando era mais jovem, as cicatrizes piores eram as que exibia no pescoço e nas faces. Polly nunca estava triste e era gentil com os outros, confortando-os. Não se queixava, mas sempre tinha tempo para ouvir as queixas dos outros. Ninguém sabia o que a levara a fazer aquilo e ninguém se atrevia a perguntar. 

Georgina divide o quarto com Susanna e é esquizofrênica, seu namorado, Brad, acha que seu pai é um agente da CIA e que possui amigos muito perigosos. 

Daisy era um evento sazonal, aparecia antes do feriado de Ação de Graças e ficava até depois do Natal. Sempre conseguia um quarto só para ela e possuía duas paixões: laxantes e frango.

Cynthia era depressiva e sempre voltava em prantos do eletrochoque, uma vez por semana. 

Janet era anoréxica e dividia o quarto com Polly. Precisava ser alimentada à força toda vez que seu peso descia abaixo de 34 quilos. 

Lisa Cody chegou depois de Susanna e logo se tornou amiga de Lisa. Quando Lisa Cody foi diagnosticada como sociopata, Lisa não gostou nada disso e as Lisas passaram a criar ainda mais problemas. 

O dia a dia dessas garotas é relatado no hospital. Como interagem umas com as outras, com as enfermeiras, como percebem o mundo trancafiadas em um hospital e como a amizade se dá, as consultas, as saídas do hospital, as rondas, o desespero, a loucura x sanidade. 

"Para muitas de nós, o hospital era tanto um refúgio quanto uma prisão. Embora estivéssemos afastadas do mundo e de todas as confusões que adorávamos aprontar nele, também estávamos afastadas das cobranças e das expectativas que nos haviam enlouquecido. O que podiam cobrar de nós, enfiadas no hospício?" (p. 109)

Garota, Interrompida, de Susanna Kaysen, é um relato marcante e franco das experiências que a autora passou no final da década de 1960. O livro conta com documentos, como ficha de internação, avaliações médicas etc. e o que aconteceu depois dos dois anos passados internada no hospital. Garota, Interrompida é um livro que mexe com diversos sentimentos e é de uma intensidade honesta e brutal, que leva o leitor a refletir sobre o que torna alguém louco ou sã. São as circunstâncias? A sociedade? A genética? E qual o grau de loucura que faz com que alguém possa ser considerado perigoso (tanto para a sociedade quanto para si mesmo)? 

Susanna tinha perfeita consciência de suas interpretações equivocadas da realidade. Mas seriam suas interpretações realmente equivocadas? 

"Essa lucidez permitia que eu me comportasse normalmente, o que suscitava algumas questões interessantes. Será que todos viam aquilo e fingiam que não viam? Seria a insanidade uma simples questão de parar de fingir? Se algumas pessoas não viam aquelas coisas, o que estava acontecendo com elas? Estariam cegas ou o quê? Perguntas como essas me deixavam abalada." (p. 52)

Quando tudo é tão volúvel, em que acreditar?

Assisti ao filme, adaptação do livro, diversas vezes, e é um dos meus filmes favoritos. No entanto, o filme é bem diferente do livro, uma coisa bem mais "hollywoodiana" mesmo, mas não deixa de ser um ótimo filme com ótimas atuações. 

Garota, Interrompida foi lançado em 1993 lá fora e aqui no Brasil neste ano pela Única Editora, selo da Editora Gente. Susanna Kaysen já publicou outros livros:

- Asa, As I Knew Him (1987)
- Far Afield (1990)
- The Camera My Mother Gave Me (2001) 

Tem promoção do livro aqui no blog, faltam só 23 horas para terminar!

3 comentários:

  1. Como já citei, acho que a Única está sendo fantástica com os lançamentos. Este é um daqueles livros que desejo bastante fazer a leitura. O legal é que eu nem me lembrava mais do filme e não lembro se já o assisti =/

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  2. o livro é bem diferente do filme, apesar da base ser a mesma. mas a verdade é que a susanna ficou um tempo perdida e a vida dela simplesmente parou. acho que talvez para algumas pessoas, as coisas pareçam tão corridas e tudo o que queremos é que o mundo pare para que possamos descer. mas não da, o mundo não para jamais.
    o livro é fininho e lembro que li em um dia. eu gostei de ter visto o prontuário da susanna, apesar dele ser bastante técnico, mais pro pessoal da área da psicologia. mas, de qualquer forma, eu gostei.
    acho que posso dizer que tanto no livro quanto no filme, a dayse é a personagem mais bizarra porque a relação dela e do pai era mega esquisita e perturbadora.
    quanto a lisa, sou suspeita. eu adoro essa louca!!!! lembrando que é a lisa que a angelina jolie interpretou, não a outra que tem no livro e passa batida.

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  3. cara eu vi o filme e sou apaixonada por ele.
    por isso sou mega curiosa pra ler o livro <3

    Seguindo o Coelho Branco

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